Cidades
Ameaça ao verde faz surgir entidade
Movimento SOS Mata Santa Genebra - Mobilização da Sociedade é criado para impedir perda de área envoltória tombada
Lu Dressano
ESPECIAL PARA A AGÊNCIA ANHANGÜERA
Um empenho pessoal e em poucas horas um movimento em defesa da Mata de Santa Genebra foi deflagrado em Campinas. As ferramentas utilizadas para desencadear informação e mobilização popular foram a indignação e a internet. O movimento SOS Mata Santa Genebra - Mobilização da Sociedade gerou uma petição pública, em circulação pela cidade, onde se pede: garantia de proteção da área envoltória, anulação da decisão do Conselho da Fundação José Pedro Oliveira (organização que preserva a mata) na aprovação de um loteamento e substituição do atual presidente da entidade, Alcides Mamizuka, responsável pela apresentação da proposta do loteamento ao lado da mata.
A comissão permanente do SOS Mata Santa Genebra, formada por 16 integrantes, decidiu pelo recolhimento de assinaturas: a campanha já conta com 1,5 mil nomes. No próximo sábado, a partir das 10h, um encontro está marcado na Praça do Coco, em Barão Geraldo, para juntar todas as listas distribuídas e finalizar a petição pública para encaminhamento ao prefeito de Campinas, Hélio de Oliveira Santos (PDT). As listas começaram a circular entre a população no último dia 24.
Tudo começou na manhã do dia 27 de abril deste ano. Ao ler uma matéria no Correio Popular sobre a polêmica de um loteamento e a tentativa de destombamento da área envoltória da mata, a artista e educadora Raquel Gouvêa fez a sua parte. "Entendi a enorme contradição desta iniciativa, que partia do próprio poder público. A notícia pedia ação e reflexão para transformar", afirma. Em poucas horas, a atitude espontânea de Raquel estabeleceu contato com 600 endereços eletrônicos, que se juntaram a mais 200 e se multiplicaram em 4 mil, segundo a idealizadora do movimento.
Em 20 dias, 55 pessoas se encontravam para uma primeira reunião, realizada no dia 16 de maio. Nesse mesmo dia, o prefeito de Campinas declarou publicamente o seu desacordo com as intenções de aprovação do loteamento.
"Comemoramos a iniciativa do prefeito, mas a mata precisa de ações e não apenas de palavras", lembra Raquel. Então, a reunião foi mantida e juntou desde o sub-prefeito de Barão Geraldo, Thiago Ferrari, a ambientalistas, estudantes, professores, representantes de ONGs da cidade e vários moradores. "Decidimos manter a mobilização e buscar o cumprimento da Lei", enfatiza Raquel.
A correspondência direta com 400 apoiadores foi estabelecida em menos de um mês: 30 entidades, entre associações e organizações não-governamentais (ONGs) de São Paulo, fizeram adesão; um blog foi criado e uma logomarca já existe para a identificação visual da mobilização. Raquel diz dedicar quatro horas por dia de seu tempo a essa causa: "Sinto que posso colocar a minha vitalidade em benefício do outro, e isso é bom", afirma.
Ela fala sobre a sua indignação com o risco: "A possibilidade de um loteamento na mata mostra a sobreposição do interesse privado sobre o público. A mata foi doada para Campinas e existe uma fundação para gerir e proteger os interesses deste patrimônio público. Ela é de todos. Logo, o seu presidente não poderia concordar com um loteamento dentro da área envoltória tombada ou trabalhar para que esse projeto fosse aprovado, desrespeitando leis e contrariando interesses da sociedade."
Para defender um interesse público, a artista e educadora fez o que qualquer cidadão poderia ter feito: entrou em contato com a Câmara Municipal e conseguiu falar com a bióloga e ambientalista Márcia Corrêa, o único voto contrário à iniciativa (ela representa as entidades ambientais no Conselho de Administração da Fundação). "Ela topou e iniciamos esta história", diz. Na mesma noite, Raquel trocou idéias com a bióloga "que estava desanimada e cansada de lutar sozinha", lembra. A sintonia da dupla foi imediata: a qualidade da vida na Terra é o desejo delas. A primeira adesão ao movimento foi uma prima de Raquel, Beatriz Couto Porto, gestora ambiental. "Ela topou e iniciamos esta história", recorda. E a Mata de Santa Genebra agradece.
Muitos problemas
Em Campinas, diz Raquel Gouvêa, os problemas ambientais são muitos e espalhados e o descaso ainda é enorme. "O poder público precisa mostrar que entendeu o fato, se posicionar e se comprometer. Entendemos o potencial de adesão em torno da mata, pois ela representa o pouco da antiga beleza de nossa cidade. Um pouco de natureza em meio a tanto concreto. A reserva é a segunda maior mata nativa em ambiente urbano do Brasil, maior que ela, só a Floresta da Tijuca no Rio de Janeiro", destaca Raquel.
Loteamento prevê alterar espaço em 300 metros
Raquel Gouvêa trabalhou por dois anos na Organização Não-Governamental (ONG) Teatro de Tábuas, com ações voltadas para a arte e educação. Foi dessa experiência em coordenação de projetos que ela encontrou o caminho para a sua indignação. É graduada em filosofia e mestre em artes, ambos pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Atualmente, prepara projeto para ingresso no doutorado na faculdade de educação, onde pretende pesquisar metodologias no ensino da arte e propor uma reflexão sobre o processo de ensino-aprendizado em artes, inspirada na pedagogia de Paulo Freire. "Esse projeto está na direção da valorização de políticas públicas na área cultural. Acredito na educação e na arte e sei que, unidas, tornam-se um poderoso instrumento de transformação humana", define. Raquel também é locutora publicitária. Há 15 anos grava para Campinas, região e rede nacional.
O loteamento
O polêmico loteamento, de 520 mil metros quadrados, está previsto em área da Monsanto, empresa química e de biotecnologia. Para ser efetivado, haveria uma redução da área envoltória de 300 metros, doando à Fundação 100 metros em toda a extensão da gleba que confronta com a reserva, além da área alagada, que corresponde à faixa delimitada pelo Ribeirão Quilombo.
Um ofício encaminhado ao sub-prefeito de Barão Geraldo, Tiago Ferrari, solicitando uma audiência com o prefeito foi protocolado no último dia 22. Mas, segundo os membros do SOS Mata Santa Genebra, "a Prefeitura não nos respondeu até hoje". Outra questão discutida em assembléia pelos membros da entidade foi o "distanciamento e desmantelamento dos conselhos municipais a partir da gestão atual". "Tanto o conselho da Fundação quanto o Condepacc estão enfraquecidos como representação", afirma Beatriz Couto Porto, que é integrante da entidade. (LD/AAN)
A ENTIDADE
Se você quiser participar da campanha ecológica, entre em contato com o SOS Mata Santa Genebra, pelo e-mail http://mail15.uol.com.br/cgi-bin/webmail.exe?Act_V_Compo=1&mailto=sosmatasantagenebra@gmail.com&ID=Iq68FOv0e5iNzdPbsUQhjHjevZyER8Ub3Ri0n&R_Folder=aW5ib3g=&msgID=11474&Body=0 ou também através do blog http://www.sosmatasantagenebra.blogspot.com/
SERVIÇO
As sugestões de pauta podem ser enviadas para http://mail15.uol.com.br/cgi-bin/webmail.exe?Act_V_Compo=1&mailto=luciene.dressano@rac.com.b&ID=Iq68FOv0e5iNzdPbsUQhjHjevZyER8Ub3Ri0n&R_Folder=aW5ib3g=&msgID=11474&Body=0r, encaminhadas à redação do Correio Popular, à Rua 7 de Setembro,189, Vila Industrial, ou sugeridas pelo telefone (19) 3772-8175.
SAIBA MAIS - Conheça dados importantes sobre a Mata de Santa Genebra
O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat) tombou a área da Reserva Florestal de Santa Genebra em 1983.
O Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural de Campinas (Condepacc) reconheceu a mata como patrimônio natural do município em 1992.
A Reserva Florestal foi declarada Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) pelo governo federal em 1985.
Pela rica biodiversidade, a mata atrai pesquisadores de universidades e institutos de pesquisa do Brasil e do Exterior.
Pesquisas já identificaram 660 espécies vegetais e 885 espécies animais, entre elas o macaco bugio (ameaçado de extinção).
Possui apenas 2,5% da cobertura vegetal nativa, distribuída em pequenos fragmentos.
É considerada o maior remanescente de Mata Atlântica em Campinas.
É a segunda maior mata nativa em ambiente urbano do Brasil
É a oitava maior unidade de conservação em área urbana do Estado de São Paulo.
A área total da mata é de 251,77 hectares e uma extensão de 9 quilômetros (entre áreas
urbana e rural).
A área da Mata de Santa Genebra foi doada para o município no dia 14 de julho de 1981, quando Campinas completou 207 anos, pela então proprietária dona Jandyra Pamplona de Oliveira. Na mesma data, a Prefeitura de Campinas criou a Fundação José Pedro de Oliveira para administrar e conservar a área que compõe a reserva. O nome da fundação é uma homenagem ao antigo proprietário da Fazenda Santa Genebra: José Pedro de Oliveira. Porém, por se tratar de uma unidade de conservação, o acesso é restrito a pesquisadores e à educação ambiental monitorada.